Em 2013 foi lançada a 5º edição do Manual de Diagnósticos de Transtornos Mentais (DSM 5). Este manual reuniu a síndrome de Asperger, transtorno desintegrativo da infância, transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação e o autismo em uma única nomenclatura: Transtorno do Espectro Autista. E inseriu o conceito dos níveis de gravidade, que em resumo são os níveis de suporte. Estes são os critérios para o diagnósticos do DSM-5 para o TEA:
- déficits persistentes na comunicação e na interação social verbal e não verbal em múltiplos contextos
- padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.
Fonte: COMPREENSÃO E PRÁTICAS BASEADAS EM EVIDÊNCIAS (2021)
Déficits persistentes na comunicação e na interação social verbal e não verbal em múltiplos contextos
Simplificando, aprendemos a nos comunicar por três vias:
- Imitação
- Seguimento de Comandos
- Modelagem de comportamentos
Imitação
Quando vamos analisar o primeiro tópico reside alguns desafios para os familiares com crianças autistas, como a imitação. Uma das grandes vias de aprendizagem na vida é a imitação. E para imitar é necessário estar como foco atencional no outro. Através da imitação é possível saber até o que o outro está sentindo, pois, reproduzimos o que estamos vendo em nosso cérebro. As pesquisas indicam que fazemos isto através de um mecanismo chamado de neurônios espelho.
Se estou tomando um sorvete delicioso, minha expressão será clara para você que aquele sorvete deve ser bom. Pois, seu cérebro reproduziu tudo em milésimos de segundo. É possível que você resolva comprar o sorvete simplesmente por conta da minha reação. E pode ser que goste ou não do sorvete ao prová-lo. Mas pelo mesmo tentou!
Porém, crianças no espectro nem sempre observam nossas expressão por diversos motivos. Pode ser que tenha mais interesse em objetos que em pessoas. É possível que olhar para pessoas cause grande descarga, pois, todos nós temos excesso de expressões o tempo todo. É possível que esta criança nem te percebeu no ambiente devido a uma falha na discriminação de estimulos. Ainda podemos falar muito sobre este primeiro critério diagnóstico, porém, este documento é apenas para dar um panorama de toda a situação.
Seguimento de comandos e modelagem
Digamos o seguinte cenário:
Na sala de jantar estava tocando uma música, o jantar é uma sopa e ao lado prato do João que é um menino de 4 anos estão disponíveis uma colher e um garfo. [PAI] – João, use a colher para comer a sopa[JOÃO] O João pega a colher e come a sopa |
O João:
- Precisou discriminar no ambiente a voz do pai.
- Entender o comando (fazer o pareamento do conceito colher com o som que o pai fez)
- Saber a diferença entre colher e garfo
- Discriminar no ambiente onde está a colher e garfo
- Processar a ação do movimento no cérebro
- Fazer a ação (processamento motor preservado)
- E comer
Só nesta sequência podemos encontrar muitos obstáculos dentro do Transtorno do Espectro Autista: discriminação de estímulos, pareamento de estímulos, diferença entre garfo e colher, processamento da ação, processamento motor e questões sensoriais com a comida líquida ou pastosa.
Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.
No segundo tópico temos os padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. É necessário que os pais observem bem os seus filhos para conseguir enxergar estes padrões, pois, às vezes podem ser sutis.
Estereotipias
As estereotipias (stims) são definidas como movimentos repetitivos e rítmicos, sem uma função socialmente clara. Porém, sabe-se hoje que estes movimentos possuem algum significado para o indivíduo autista. Por exemplo, podem ser movimentos que geram alguma sensação de bem-estar ou equilíbrio (organização) em seu comportamento. Vale lembrar que não são só os autistas que possuem estereotipias, existem pessoas que possuem diversas estereotipias e não são autistas.
Quando pensamos no momento da refeição familiar, imaginamos uma família sentada em volta de uma mesa e usando talheres para comer. Os familiares costumam só se levantar ao acabar a refeição. Agora vamos imaginar duas famílias com crianças autistas. Uma menina que sua estereotipia é correr de uma lado para outro e um menino que é chocalhar qualquer objeto que entregue em suas mãos. Já podemos ver que a refeição em família não será nada fácil.
Inflexibilidade
Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal. Para esta característica tenho dois casos concretos: um que recebi de uma seguidora do meu canal do Instagram e outro na pós-graduação em ABA.
Uma mãe mandou várias fotos da criança alinhando os pratos da mesa, talheres, potes dos alimentos, copos etc. A mãe relatou que a criança começou apenas alinhando o talheres e ao decorrer foi acrescentando novos itens. Só após finalizar o alinhamento de tudo a criança aceita iniciar a refeição. A criança entra em “crise” quando alguém tira um item da sequência. Na pós vi um caso de uma criança que só aceitava alimentos que fossem cortados em formato de triângulo. Outro caso comum são de crianças que só comem um alimento específico, de uma marca específica e com um formato específico.
Agora vamos pensar num bebezinho autista que passou por quase 10 meses de vida apenas com alimentos pastosos. E agora a mãe começa a introduzir os alimentos sólidos. No início a rejeição parece ser padrão. Porém, não há melhoria com tempo. A mãe não consegue fazer esta transição alimentar. E algumas vezes, acaba desistindo por um tempo (reforço intermitente do comportamento).
Hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais
Hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente (como indiferença aparente à dor/temperatura, reação contrária a sons ou texturas específicas, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, fascinação visual por luzes ou movimentos).
Uma outra característica no autismo é a Alexitimia. Essa condição é a incapacidade de entender as sensações. Por exemplo, entender as sensações relacionadas à saciedade, dor, frio, calor.
“Embora a neurociência ainda não tenha sido capaz de explicar com detalhes as alterações sensoriais no cérebro das pessoas no TEA, sabemos que circuitos talâmicos de integração sensorial, circuitos cerebelares e do córtex parietal e pré-frontal são envolvidos na fisiopatologia da hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais.“ (IEPSIS, DR Paulo Liberalesso, 2021)
Dentre tantas palavras difíceis segue um exemplo prático: digamos que a criança morda um pedaço de carne. Ao invés, a sensação da informação de ser mandada para as partes adequadas do cérebro manda para outras partes. Com isso, por exemplo, a criança pode sentir dor ou não sentir absolutamente nada, como nem estivesse comendo.
Cerca de 29% dos indivíduos autistas podem ter transtornos alimentares e é mais evidente em mulheres. E para piorar estes números são quase 1 mulher para 4 homens diagnosticados com autismo
Como lidar com a exigência alimentar no TEA?
Como lidar com uma exigência alimentar no Transtorno do Espectro Autista quando torna-se um comportamento ruim para o desenvolvimento da criança? Adoraria dar uma resposta simples, mas infelizmente, para problemas complexos, teremos soluções igualmente complexas.
Para traçar uma solução será necessário desenvolver um Plano de Intervenção Comportamental (PIC). Treinar e trabalhar o comportamento dos pais será essencial para alcançarem os objetivos desejados. O PIC inclui os seguintes tópicos:
- Comportamento-alvo e avaliação funcional
- Hipóteses
- Sensorial
- Fuga da demanda
- Atenção
- Tangível
- Coleta de dados
- Avaliações
- Testes
- Hipóteses
- Reforçadores
- Estratégias de prevenção
- Estratégias de ensino
- Consequências
- Generalização e manutenção
Lembre que é uma intervenção multidisciplinar. É muito interessante ter na equipe nutricionista, terapeuta ocupacional, analistas do comportamento que entendam realmente sobre autismo.
Liga Autismos, a maior e mais acolhedora comunidade sobre autismo do Brasil.
Saiba mais sobre ela tocando abaixo.
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Gostei muito das informações!
Meu neto do come três alimentos por vez. Diz que só pode três.